Tentação, No País dos Ianques – Adolfo Caminha (trecho)

Tentação, No País dos Ianques – Adolfo Caminha

Ia enfim realizar-se a misteriosa e pranteada viagem do imperador. Na eterna alegria do sol, que amanhecera esplendidamente luminoso, flutuavam preces ao bom Deus pelo pronto regresso do monarca. Suspiros de saudade, louvores à boca pequena, exclamações de inconsolável tristeza erguiam-se nas ruas da cidade, formando uma atmosfera de vagas melancolias, um como ambiente glacial de apreensões sinistras que a luz triunfal do sol não espancava. Ia ficar deserta a Quinta de São Cristóvão e o Brasil sem o imperador, o Brasil sem o Sr. D. Pedro II era como Um país abandonado à aventura dos selvagens… Oh, o homem extraordinário que antes de ser homem era rei! que tristeza para o povo, que desolação para a Corte! Ninguém queria acreditar naquela viagem lúgubre como a própria morte…

No entanto, chegava a hora do embarque. Apresentavam-se as carruagens; não havia tempo a perder.

Às seis horas da manhã o desembargador Lousada e a mulher, em berlinda especial, abalaram para a Tijuca. A ilustre dama de Sua Majestade, a imperatriz, ia chorosa, com o lenço nos olhos, quase muda na sua toilette de seda marrom. O visconde de Santa Quitéria, amigo particular do imperador, não quis deixar de cumprir o religioso dever que lhe impunham a amizade e a gratidão: lá foi também corretamente encasacado, de luvas pretas. E outros e outros personagens de etiqueta levaram a sua homenagem aos augustos viajantes.

Luís Furtado entendeu que melhor seria assistir ao embarque no Arsenal de Marinha com D. Branca e os Holanda. Mas Evaristo foi dizendo logo que “só costumava ir ao embarque dos seus amigos e que não transigia com as suas convicções…”

– Não se trata aqui de convicções, nem de idéias políticas – fez o secretário. – É um dever de todo o brasileiro levar as suas despedidas ao imperador, ao homem que nos governa há quase cinqüenta anos e cujas virtudes o mundo inteiro admira…

Fonte: / Livraria José Olímpio Editora – 1979.