Amor de Perdição – Camillo Castelo Branco
“Considero-te perdida, Teresa. O Sol de amanhã pode ser que eu o não veja. Tudo, em volta de mim, tem uma cor de morte. Parece que o frio da minha sepultura me está passando o sangue e os ossos.
Não posso ser o que tu querias que eu fosse. A minha paixão não se conforma com a desgraça. Eras a minha vida: tinha a certeza de que as contrariedades me não privavam de ti, Só o receio de perder-te me mata. O que me resta do passado é a coragem de ir buscar uma morte digna de mim e de ti. Se tens força para uma agonia lenta, eu não posso com ela.
Poderia viver com a paixão infeliz; mas este rancor sem vingança é um inferno. Não hei de dar barata a vida, não. Ficarás sem mim, Teresa; mas não haverá ai um infame que te persiga depois da minha morte. Tenho ciúmes de todas as tuas horas. Hás de pensar com muita saudade no teu espôoo do céu, e nunca tirarás de mim os olhos da tua alma para veres ao pé de ti o miserável que nos matou a realidade de tantas esperanças formosas.
Tu verás esta carta quando eu já estiver num outro mundo, esperando as orações das tuas lágrimas. As orações! Admiro-me desta faisca de fé que me alumia nas minhas trevas.!… Tu deras-me com o amor a religião, Teresa. Ainda creio; não se apaga a luz, que é tua; mas a providência divina desamparou-me.
Lembra-te de mim. Vive, para explicares ao mundo, com a tua lealdade a uma sombra, a razão por que me atraíste a um abismo. Escutarás com glória a voz do mundo, dizendo que eras digna de mim.
A hora em que leres esta carta…”